O roteiro de James Ivory é um dos pontos fortes da metragem por ser hábil ao construir uma atmosfera passional. Apesar da própria ambientação e da própria trilha sonora inspirarem um tom onírico, como se fosse uma viagem no tempo para um local remoto, o roteiro é capaz de desenvolver muito bem a dupla de protagonistas, principalmente seus conflitos internos. É perceptível a confusão de Elio no que se refere a sua sexualidade, afinal o menino se sente atraído, a princípio, por ambos os sexos. E a confusão que isso provoca na sua cabeça é de uma suavidade tremenda. Além disso, muitas vezes entendemos a situação de cada personagem simplesmente por causa da linguagem corporal. Entretanto, esse tom contemplativo acerca do ato de se apaixonar incomoda no início do filme, pois faz com que o ritmo seja extremamente defasado. A primeira metade do longa é desnecessariamente arrastada, haja vista que o espectador já é capaz de perceber onde o roteiro quer chegar, mas este não caminha, fazendo com que o ritmo se torne um pouco cansativo. Mesmo assim, a partir da segunda metade do filme, o diretor parece ter total convicção sobre os rumos que sua história deve tomar, engrandecendo demasiadamente a sua obra a partir de então. E é na química entre os protagonistas que a projeção se vale, visto que o roteiro sensível a as atuações viscerais são capazes de prover sutilezas essenciais para a credibilidade do romance. Outro ponto muito forte da obra é a construção de personagem do Mr. Perlman (pai de Elio). Ao longo do filme, o personagem apresenta uma aura com um quê de mistério e o público parece nunca ser capaz de perceber o que o move. Chega no clímax e, então, somos presenteados com um monólogo belíssimo capaz de exemplificar toda a mensagem do filme e encerrar o arco do personagem. Assim como "Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças" propunha, o amor nunca deve ser esquecido, pois, mesmo que tenha trazido dor, são os momentos de felicidade que servem para engrandecer o eu.
Nesse sentido, a direção consegue ser hábil e sensitiva: o espectador é transportado através das sensações dos personagens. Trata-se de um filme passional, quente, que, com a ajuda do cenário e das próprias referências à cultura greco-romana, discute os conceitos de beleza e de desejo. A câmera de Guadagnino, apesar de estática em grande parte do tempo, é muito minimalista: são os pequenos detalhes que engrandecem a história do filme. Tudo isso é muito ajudado pela excelente trilha sonora, capaz de emocionar devido à profundidade das canções. Aliás, "Me Chame Pelo Seu Nome" é um filme que inspira muito sentimento em todos os seus quesitos e é espetacular na forma como quer passar sua mensagem. Muitos diretores que não fossem hábeis ao contar uma história, focariam na descoberta da homossexualidade como fator crucial da trama. Todavia, aqui vemos isso surgir como pano de fundo para uma extraordinária jornada de aceitação e descoberta do próprio amor. O ambiente gerado pela composição visual e a perfeita sincronia entre os atores faz com que o filme apresente uma leveza tremenda, o que faz ser prazeroso assistir "Me Chame Pelo Seu Nome". Em tempos de crescimento dos discursos de ódio, o filme surge como uma ode à diversidade e se apresenta como uma importante obra de representatividade. O fato de uma premiação como o Oscar prestigiar o filme é importante para dar visibilidade à discussão sobre o preconceito e, como diria Lulu Santos, a obra mostra que "Consideramos justa toda forma de amor".
Por fim, mesmo que o roteiro sensível e a direção bem realizada segurem bem a trama, o destaque principal fica com a atuação dos protagonistas. Timothée Chalamet rouba o filme ao representar um menino inteligente e culto, mas completamente inseguro de suas qualidades. Além disso, o ator consegue dar diferentes facetas ao personagem, o que facilita o apego do público à ele, tendo em vista que todos os seus anseios e dúvidas tornam-se críveis. Ao seu lado, Armie Hammer surge como um contraponto: extremamente seguro de suas decisões, seu personagem surge na vida dos Perlman trazendo vivacidade e inspirando novidade. Mesmo sendo tão diferentes, a química fornecida pelo roteiro é potencializada pela enorme devoção da dupla: repare nos olhares de desejo, nos pequenos gestos físicos que demonstram uma completa devoção. E para completar temos Michael Stuhlbarg em excelente forma, interpretando um pai compreensivo e amoroso, que, mesmo sendo reprimido pela sociedade e por ele mesmo, busca ajudar o filho na jornada de aceitação. Dessa forma, "Me Chame Pelo Seu Nome" trata da descoberta do amor e da aceitação dele, mostrando que, mesmo o sofrimento decorrente desse sentimento é precedido por uma história muito feliz. Luca Guadagnino parece compreender isso nesse filme repleto de paixão, suavidade e desejo.
Nota:

- João Hippert
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