sexta-feira, 8 de março de 2019

Crítica de "Capitã Marvel"

A última década foi dominada pelos filmes de herói e é impossível não reconhecer o protagonismo da Marvel nesse âmbito. Começando com o excelente "Homem de Ferro", em 2008, o estúdio vem lançando de 2 a 3 filmes por ano desde então. Porém, o que é mais curioso nisso tudo é que, mesmo depois de tantos filmes, o estúdio foi conservador a ponto de não trazer nenhum longa com protagonista feminina anteriormente. A Marvel aparentemente embarcou no embalo do sucesso de "Mulher Maravilha" - um dos poucos acertos da concorrente nos últimos anos - para produzir o seu primeiro longa protagonizado por uma heroína. E o resultado? Bem, poderia ter sido bem mais satisfatório. O longa acompanha Carol Danvers (Brie Larson) na sua jornada de autoconhecimento, de descoberta de seu próprio passado e de controle dos poderes. Nesse sentido, o longa remete muito à estrutura clássica dos filmes de apresentação de heróis da Marvel: todos os conflitos são bem delimitados, não deixando espaço para grandes reviravoltas. Contudo, isso por si só não prejudica o filme: muito pelo contrário. O grande problema do roteiro é sua necessidade de grandiloquência - algo recorrente nos filmes do subgênero -, tendo em vista que a apresentação da Capitã Marvel para o grande público não precisa implicar necessariamente em uma guerra interplanetária. Aliado ao fato de que o filme se passa nos anos 1990, logo já sabemos das consequências daquilo que a história mostra, o clímax se demonstra muito artificial e pouco empolgante. O uso dos clichês nessa parte é feito em demasia e os "fan services" são completamente desnecessários e até desmistificam um pouco a áurea misteriosa de alguns fatos do MCU (algo que lembra bastante o fracasso que foi feito no filme do Han Solo).

O que mais decepciona em "Capitã Marvel" é a sua primeira metade que se demonstra muito eficiente. A apresentação da personagem é feita de forma fluida, assim como a sua relação com o personagem Nick Fury (Samuel L. Jackson). Aliás, um dos grandes acertos do roteiro está justamente no desenvolvimento da relação entre os dois personagens, e a química é visível. Sem nunca apelar para a comédia escrachada, a dupla remete aos clássicos personagens de filmes de "tira", o que dá um tom bastante interessante para essa parte da metragem. Além disso, a descoberta de Carol  acerca do seu passado e das suas responsabilidades também é bem crível: Briel Larson consegue prover um alcance emocional elevadíssimo, tornando todo o drama em torno da protagonista extremamente mais tocante. Por outro lado, Brie Larson, mesmo que possua todas as características de uma excelente atriz, peca em um aspecto crucial: o carisma. Nesse ínterim, a comparação com Gal Gadot é inevitável. Embora seja uma atriz de menor calibre do que a vencedora do Oscar Brie Larson, Gal Gadot possui uma energia incrível e cativante. Ela simplesmente é a Mulher-Maravilha, compra os ideais da personagens e exerce um papel que transcende à sala de cinema. Brie Larson, no entanto, apesar de possuir o já citado alcance dramático, não consegue prover uma atuação tão carismática a ponto de fazer o espectador imergir naquela história e comprar aquela personagem. Isso se faz problemático em um filme de heroína, pois tira o espectador da empolgação inerente à história, provocando uma quebra de ritmo prejudicial.

Ademais, o ritmo também demonstra defeitos, à medida que a direção de Anna Boden e Ryan Fleck se mostra ineficiente nas cenas de ação. Tratando-se de um filme de heroína, um dos grandes cuidados da direção deve ser localizar bem o espectador nos ambientes físicos das lutas e perseguições - o que não acontece. Tudo aqui é basicamente jogado na tela, e a coreografia não ajuda. Ainda que a fotografia apresente belos momentos e alguns enquadramentos soem absolutamente memoráveis, a constante confusão das cenas de ação promove uma sensação desgostosa no público, e mais enjoa do que empolga. Configura-se, dessa forma. como outra decisão errada da direção como um todo, já que as cenas baseadas em diálogo e em apresentação de conflito são muito boas. O que fica quase nítido ao fim da metragem é que "Capitã Marvel" é um filme feito às pressas, que seguiu uma onda recente promovida pela DC. Embora tenha uma base sólida e com potencial de ser um dos grandes filmes da Marvel, o filme se limita a seguir clichês preestabelecidos, contando com um ritmo final que deixa um gosto amargo no espectador. É mesmo um daqueles filmes que o final deixa tanto a desejar que chama muito mais a atenção do que o início promissor - e isso deve ser pontuado. Afinal, "Capitã Marvel" não pode ser encarado apenas como mais um filme da Marvel, haja vista seu grande apelo sociocultural, no que tange à representatividade feminina.

Por um lado, temos finalmente uma heroína da Marvel sendo protagonista de um filme solo. Por outro, temos um filme mediano. Como colocar essas duas coisas na balança? "Capitã Marvel" tem um papel social muito mais relevante do que a sua própria qualidade artística em si, o que é uma pena. Tratando-se de um filme que trata do empoderamento e da representatividade, a mensagem é muito mais bem aceita quando colocada em uma obra tratada com carinho e que saiba aonde quer chegar. Mas, aqui, vemos um filme esburacado, com um roteiro com alguns momentos de inspiração, mas com uma direção totalmente desequilibrada. Ainda assim, enxergando o MCU como um todo, "Capitã Marvel" tem seus méritos enquanto parte do universo, por apresentar fatores importantes para a resolução de "Vingadores: Ultimato" - ainda que seja muito pouco frente ao potencial da metragem. Entre erros e acertos, "Capitã Marvel" se distancia dos recentes sucessos "Mulher-Maravilha" e "Pantera Negra", se mostrando um filme irregular, ainda que com uma temática importantíssima.

Nota: 

- João Hippert

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