sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Crítica de "Steve Jobs"

Steve Jobs. Um dos maiores gênios do século 20, criador da dominadora do mercado mundial dos computadores, a Apple. Como todo gênio, Jobs não era perfeito, possuía problemas emocionais, dificuldade de relacionamento com familiares, além de medo de ser rejeitado. E é isso que o faz tão grande: o fato de ser um homem "ordinário". Não no sentido ruim da palavra, mas por ser um cidadão comum como qualquer outro, com problemas e decepções, mas um pensamento empreendedor, sem precedentes. E é essa face de Jobs que o filme de Danny Boyle retrata. Diferente de "Jobs" protagonizado por Ashton Kutcher que apresentava Steve Jobs como inalcançável e tratava muito mais da sua genialidade do que na persona em si, "Steve Jobs" apresenta seu protagonista da forma mais humana possível. E essa é a grande homenagem que o filme poderia prestar, visto que o que é retratado é o homem por trás das invenções, a ideia de que sem ele, nada existiria. Não é preciso olhar para o resultado final de uma obra para avaliá-la, mas sim o que a inspirou e o porquê dela existir, de modo até mesmo sociológico. O grande mérito do filme é mostrar tudo isso: a razão de Jobs criar os computadores, além das características pessoais do homem e seus atos falhos que não o desmerecem, mas o engrandecem devido a sua face tão palpável.

Tal grandioso roteiro é escrito por Aaron Sorkin. Um dos melhores roteiristas de Hollywood, é responsável por "O Homem que Mudou o Jogo" e "A Rede Social". É evidente o traço de sua escrita no filme, visto que a estrutura narrativa se assemelha muito com a da história do criador do Facebook. Mas aqui, é ainda mais brilhante. O roteirista convencional teria contado a história de Jobs desde o começo, nos fundos de garagem com o sonho de um dia alcançar o sucesso. Mas, no início do filme, já somos apresentados a um Steve Jobs famoso, às vésperas de um lançamento importante. É notável como em tão pouco tempo o personagem já prende a atenção do público. Claro, é o Steve Jobs. Mas, o grande acerto aqui, é o fato do roteiro já começar num nível tão alto de desenvolvimento de personagem. Em vez de tentar seguir uma espécie de gráfico afim, o qual sobe linearmente, o roteiro já apresenta o protagonista no topo de tal gráfico. Dessa forma, as linhas emocionais de narrativa de Jobs que vão sendo apresentadas aos poucos somente engrandecem a perspicácia do começo do longa. Além disso, uma coisa surpreendente foi a apresentação de outros personagens. Mesmo Jobs sendo o foco da narrativa (como tinha de ser), os outros têm espaço para serem desenvolvidos e contribuem muito para o desenrolar da história como um todo. É notável como cada personagem tem um tipo de relação diferente com o protagonista e como isso é apresentado de forma natural. O roteiro mostra um homem falho moralmente, com problemas de identificação, com um temperamento difícil e extremamente arrogante, que nunca se vê errado sobre nada. Existe forma mais bonita de se homenagear um ícone? Ao conhecermos os pontos fracos de Jobs e a forma como ele ultrapassou esses obstáculos em busca de um sonho maior, seu legado engrandece. Claro, todos conhecem Steve Jobs. Mas, duvido muito, que conhecem dessa forma.

A direção é de Danny Boyle, diretor de "Trainspotting" e "Quem quer ser um Milionário?". Sua direção é extremamente eficaz. O diretor apresenta muitos cortes em seu material, mas tudo isso resulta numa total imersão no cenário, visto que existem diversas posições de câmera presentes no longa. De acordo com a movimentação dos atores em cena, o diretor faz cortes ágeis e direciona a ação para outras câmeras. Isso é um artifício muito bem utilizado por Boyle que enaltece a ambientação. Dessa forma, o espectador se vê preocupado com a história em si, e não se vê preocupado com possíveis problemas técnicos. O uso de cores feito pelo diretor também é valioso, pois dão a tonalidade necessária a cada cena. Com o auxílio da trilha sonora, existem momentos extremamente introspectivos que promovem uma auto-reflexão no espectador. Tratando-se de uma cinebiografia, o diretor não precisava de dilemas morais. Mas, por isso o filme se vangloria, por não apresentar, sob nenhum aspecto, elementos clichês de filmes baseados na história de alguém. Trata-se de um filme original, que parece se basear na história de um ícone, mas que tem uma importante mensagem por trás.  Tal realização é difícil de se ver, pois, normalmente, o fato real supera a arte. Porém, aqui, é diferente. O filme configura-se como uma importante obra cinematográfica, por ser tão original, ao mesmo tempo que respeita seu protagonista.

O elenco está simplesmente sensacional. Michael Fassbender foi uma escolha acertadíssima, pois apresenta uma evolução de acordo com o personagem que condiz extremamente com roteiro. Além dele, Seth Rogen merece destaque por um papel contundente e que não pesa para o lado do humor. Jeff Daniels também provê uma interpretação excelente, mas o destaque é Kate Winslet, que dá muitas camadas a uma personagem não tão importante para a história, a princípio, mas que aos poucos se torna crucial. O grande mérito do filme é aliar um roteiro brilhante com uma direção sólida, capaz de dirigir atores e dar uma boa continuidade a história. Tratando-se de uma cinebiografia do criador da Apple, o filme não poderia ser convencional. A inovação está na forma como o filme trata seu protagonista, mostrando que Jobs era um ser imperfeito. E, é isso, que o torna tão humano (e tão extraordinário).

Nota: 

- Demolidor

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